A equipa da Federação Mundial de Anunciantes (WFA, na sigla em inglês) partilhou as suas previsões sobre o que as marcas poderão esperar dos próximos 12 meses.
- Começar a abordar o tema das alterações climáticas
Este foi o ano em que a Extinction Rebellion (movimento sociopolítico internacional que pretende usar a resistência não-violenta para evitar o colapso do clima) chegou a Cannes e em que uma jovem de 16 anos, Greta Thunberg, acusou os líderes mundiais de estarem a roubar-lhe o futuro, sendo nomeada “Pessoa do Ano” pela revista Time. Muitas marcas tentam abordar as alterações climáticas à sua maneira, mas, à medida que as vozes dos ativistas pelo clima se tornam mais fortes, cada empresa terá de se questionar sobre o que está a fazer pelo futuro do nosso planeta. A indústria do marketing, tradicionalmente vista como um condutor do consumismo, enfrenta agora um desafio intimidador ao qual precisará dar respostas convincentes. 2020 verá mais protestos, mais greenwashing, mais ataques às marcas e, com um pouco de sorte, mais soluções inteligentes e criativas.
- Ir para além do género
As imagens das pessoas na publicidade afetam a forma como pensamos o mundo. Nos últimos anos verificaram-se grandes esforços de algumas marcas em garantir que a publicidade promove imagens mais responsáveis e progressistas de género. Mas, como afirmou Belinda J. Simth, Head of Global Marketing Intelligence da Electronic Arts: “diversidade tem sido até agora aceite para simplesmente significar ‘mulheres’ e, mais frequentemente, ‘mulheres brancas’”. Estereótipos de género não existem no vazio, estão habitualmente ligados a estereótipos de raça, etnia, orientação sexual, atividade física, grau de formação e educação. As marcas podem fazer muito mais para retratar a sociedade em toda a sua diversidade. Esperamos que em 2020 se comece a ver um trabalho progressivo neste sentido e que se torne habitual.
- Marketing a alimentos na mira
Apesar de toda a conversa da Organização Mundial de Saúde sobre o crescente envolvimento do setor privado, as marcas de produtos alimentares e restauração não devem esperar tréguas dos reguladores da saúde em 2020. O atual vergonhoso modelo “Chileno” (Chilean model), que trata a rotulagem e o marketing dos alimentos com elevado teor de gordura, sal e açúcar como tabaco (com grandes alertas de saúde, proibição de colocação de brindes e utilização de personagens, etc.) espalhou-se como fogo selvagem pela América Latina até ao Peru, Uruguai e México. Os reguladores na Argentina e em Singapura estão agora a considerar proibições completas também para adultos. Em 2020, espera-se que mais países se inspirem no exemplo da América Latina e que alguns, sob a premissa do chamado princípio da precaução, olhe de forma indiscriminada para as proibições ao marketing de refrigerantes açucarados e de quaisquer outros produtos alimentares que não cumpram os critérios nutricionais.
- Marketing do álcool volta a estar em foco
Globalmente, o marketing do álcool é muito mais restrito do que o marketing dos alimentos e bebidas não alcoólicas, sobretudo por motivos culturais. Mas, nos países onde ainda é permitido e onde os reguladores não têm conseguido reduzir as excessivas taxas de consumo, espera-se uma tendência para colocação de alertas de saúde nas garrafas, nos patrocínios e na comunicação online. A pressão será mais sentida na Europa, onde as taxas de consumo de álcool são globalmente mais elevadas e na América Latina, onde as autoridades de saúde foram encorajadas pelas suas vitórias sobre na Big Food. As empresas de bebidas alcoólicas em parceria com as plataformas de redes sociais têm feito grandes esforços na aplicação de controlos para evitar que menores vejam anúncios de bebidas alcoólicas. Alguns países adotaram proibições à publicidade a bebidas alcoólicas que se estendem às redes sociais. Espera-se mais pressão em 2020 para um maior controlo, tanto online como offline.
- Dados de crianças: o Youtube levou um golpe em 2019 – é o Facebook a seguir?
O ano passado a WFA previu que 2019 seria o ano em que o Facebook e a Google não poderiam manter os olhos fechados relativamente à presença de crianças nas suas plataformas. Com efeito, o Acordo da FTC (Federal Trade Commission), em setembro deste ano, veio traçar uma linha clara: as grandes plataformas não podem gabar-se juntos dos anunciantes de ter audiências jovens e depois negar ter “conhecimento real” desta presença, garantindo que estão a cumprir as leis da privacidade. O YouTube está já a pôr em prática medidas ambiciosas para conteúdo infantil, cumprindo o Acordo da FTC. Apesar de 2020 oferecer ao Facebook uma oportunidade de melhorar pró-ativamente as suas políticas e os seus processos, calcula-se que sejam os reguladores a forçar essa mudança.
- O comboio da privacidade continua em marcha
O RGPD é uma realidade há mais de um ano e o “comboio” da privacidade não mostra sinais de abrandamento. 2020 verá novas e significativas leis de privacidade entrarem em vigor nalguns dos maiores mercados de publicidade do mundo, incluindo EUA (janeiro na Califórnia) e Brasil (agosto). Na Índia, o parlamento começa a discutir, no primeiro trimestre do ano, a primeira grande legislação de privacidade do país. Se o RGPD é algo a ser seguido, irá provavelmente ter um impacto significativo na publicidade, à medida que os profissionais de marketing enfrentem restrições adicionais no acesso aos dados sobre as suas campanhas de marketing digital – não apenas para segmentação, mas também para medição do alcance. A WFA estará a acompanhar tudo através do WFA Global Privacy Map, disponível para download aqui.
- Duopólio para atrair mais interesse regulatório
Os marketers têm vindo a debater o duopólio digital da Google e do Facebook há algum tempo e os reguladores das práticas anticoncorrenciais estão a começar a interessar-se pelo tema. 2020 verá investigações a este tipo de práticas ganhar forma – desde a Austrália ao Reino Unido. Até a líder Europeia da Concorrência, Margarethe Vestager, já questionou sobre como a Google e o Facebook recolhem, processam, usam e monitorizam os dados, incluindo para fins publicitários. Não existe previsão de quanto tempo levam estas investigações, mas a mensagem é clara: os reguladores querem saber mais sobre comos estas empresas usam os dados e a publicidade está no cerne das questões. Podem esperar-se mais sanções…
- Contra o lado feio da Internet
Discursos de ódio, abuso de crianças, bullying, terrorismo, racismo, fake–news… 2019 foi um ano em que o lado feio da Internet esteve bastante exposto. Os dirigentes começaram a questionar quem é o responsável e como pará-lo. Facebook, Twitter e Google foram levados a enfrentar auditorias e para o próximo ano podemos começar a ver a resposta regulamentar. Reguladores por todo o mundo vão debater quanta responsabilidade deve recair sobre os gigantes da tecnologia. As marcas têm um importante papel a desempenhar, sendo a segurança da marca uma prioridade para os membros da WFA. Os debates sobre o tipo de conteúdo que pode e deve ser monetizado vão ser importantes para uma resposta global a este assunto.
- Equilibrar o curto e o longo prazo
A preocupação com o excesso de ênfase no curto prazo não é novidade. “The Long and the Short of it”, de Peter Field e Les Binet, foi publicado pelo IPA (Institute of Practitioners in Advertising do Reino Unido) há sete anos. No entanto, encontrar o equilíbrio certo provou ser um desafio para a maioria das marcas, sejam elas marcas de bens de grande consumo com mais de 100 anos e grandes investimentos em modelos econométricos ou marcas com venda direta ao consumidor com uma crença inabalável em modelos de conversão. Com 80% dos anunciantes a responderem ao estudo de marketing da WFA e concordando que “o nosso programa de eficácia é excessivamente focado no curto prazo”, prova que há um grupo de empresas que querem mudar. A chave será, obviamente, evitar o excesso de confiança numa única solução e encontrar programas de medição integrada adequados a cada organização – equilibrar a medição e o investimento, a curto e longo prazo.
- Unificar os objetivos da empresa
Ao lado de ‘CMO’, ‘KPI’ é provavelmente o acrónimo mais utilizado na nossa indústria. Chegámos à fase em que vemos apresentações que falam sobre os principais KPIs?! No entanto, parece que as marcas começam a evoluir as suas abordagens em direção a resultados partilhados. Em vez de aumentar investimentos isoladamente em diferentes funções, será que vamos começar a ter objetivos multifuncionais trabalhando no mesmo sentido para resultados comuns? Como qualquer grande mudança, esta provavelmente partirá de responsáveis de Media, Marketing ou Procurement. Mas o fator-chave poderá ser o marketing de operações, um papel que tem ganho destaque e que conta com uma interessante perspetiva transversal, tornando-o bem posicionado para identificar e impactar mudanças.
- Evolução de parcerias
O significado da palavra ‘parceiro’ na indústria do marketing e publicidade tem vindo a ser deturpado. Começou provavelmente por clientes bem-intencionados que queriam demonstrar o valor que dão ao relacionamento com as suas agências. Chegados a 2020, parece que agora somos todos parceiros: agências, patrocinadores, consultores, plataformas digitais e meios de comunicação… A lista continua, mesmo que os clientes não sejam os parceiros mais monógamos. Mas uma nova e interessante área é aquela em que os clientes estabelecem parcerias com outros clientes, por exemplo, através de campanhas cooperativas, compras conjuntas, partilha de dados ou a simples troca de conhecimento entre não concorrentes.